Fotos: Lucas Amorelli (Diário)
Luan estuda e trabalha no Centro Universitário Franciscano (Unifra)
O olhar de curiosidade das pessoas vem de todos os lados, e o preconceito ainda é a parte mais difícil. Mas quem é pequeno, apenas no tamanho, pode, sim, ter uma vida normal. Geralmente representados de forma irônica ou pejorativa em produções artísticas, anãs e anões têm, agora, a oportunidade de aproveitar a discussão fomentada pela novela O outro lado do paraíso para expor a sua realidade e mudar a forma como essa condição é vista socialmente. O tema que vem sendo abordado no horário nobre tem mostrado os problemas e preconceitos que eles sofrem, inclusive dentro da própria família, que, muitas vezes, não compreende o "aparecimento" de uma pessoa com nanismo na genética familiar.
- O tipo de nanismo mais comum é a acondroplasia, registrando um caso a cada 12 mil nascidos. Existem vários tipos de alterações ósseas, extremamente variáveis, envolvendo genes dominantes, recessivos ou mesmo ligados ao cromossomo X. Para orientar as famílias de estatura mediana e as pessoas que têm nanismo e casam entre si, é preciso saber de qual tipo eles são portadores para avaliar as circunstâncias, pois nem sempre significa que eles terão filhos com a mesma condição - explica a médica geneticista Dafne Dain Gandelman Horovitz, que é também vice-presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica (SBGM).
A acondroplasia é uma displasia - um tipo de anomalia - causada pela alteração do gene receptor três do fator de crescimento dos fibroblastos (FGFR3), responsável pela produção de proteínas que reagem ao hormônio do crescimento e que estão ligadas ao desenvolvimento das cartilagens e dos ossos. Ou seja, é um tipo de nanismo. Dafne revela que um dos fatos que talvez ainda seja desconhecido pela maioria da população é que 80% dos recém-nascidos com a alteração genética que impede o crescimento normal dos ossos vem de uma "mutação nova". Isso quer dizer que, na maioria das vezes, é a primeira ocorrência na família.
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LUTA DIÁRIA
Aos 5 meses de gestação, a mãe de Luan de Freitas Souto descobriu que a gravidez era de risco. O médico da cidade de São Gabriel a encaminhou para Santa Maria, onde havia mais recurso. Ainda nos exames de ultrassom, foi possível ter o diagnóstico: Luan tinha os ossos menores e nasceria com acondroplasia. Foi na pré-escola que Luan percebeu que tinha algo diferente entre ele e os colegas.
- Na infância, eu vi que eu era menor que as outras crianças. Na adolescência, tive a ajuda de muitos amigos. A minha família nunca disse que eu não ia conseguir fazer alguma coisa porque eu era menor ou porque eu iria me machucar. Nós somos normais e podemos fazer tudo, estudar, trabalhar, praticar esportes. Temos uma vida normal. O que mais chateia é o preconceito, porque, para alcançar alguma coisa, a gente pede ajuda, dá um jeito, se adapta - comenta.
Luan é estudante do 4º semestre do curso de Sistemas de Informação do Centro Universitário Franciscano (Unifra), mesmo local em que trabalha dando suporte técnico nos computadores e laboratórios de informática da instituição. Ele comenta que não fez questão de exigir que a sala fosse adaptada, para alcançar os objetos, ele usa uma escada móvel. Mas o mais difícil mesmo é lutar contra o preconceito:
- Já aconteceu de eu ir no cinema, e os pais chamarem as crianças para nos ver. Os pais estimulam o preconceito, dizem para olhar, pedem para tirar foto, para mostrar para as crianças o nosso tamanho. Mas, com a novela, isso está diminuindo um pouco. Mas, às vezes, não tem como não se chatear. Tem dias em que vamos ao shopping querendo se divertir, e é tanto deboche que chega a estragar o final de semana - lamenta.
Há quase 5 anos, Luan divide as angútias e supera os desafios ao lado da namorada, Marília Souza Cezimbra, que também tem acondroplasia. Juntos, já tiveram que driblar situações constrangedoras. Eles contam que, aos poucos, a novela está fazendo as pessoas mudarem as atitudes. Depois de passar em um concurso público, aos 23 anos de idade a jovem foi morar sozinha em Porto Alegre para trabalhar na prefeitura de Alvorada, na região metropolitana. A dentista conta que, antes mesmo de começar a trabalhar na clínica, os equipamentos foram adaptados, da mesma forma que na casa dela.
- No meu trabalho eles adaptaram muita coisa, como a cadeira, o ponto eletrônico, o papel para secar a mão, e estão sempre dispostos a me ajudar quando preciso. Meus colegas também perguntam se preciso de ajuda, ou eu mesmo peço para eles, ainda estão se adaptando a trabalhar com uma pessoa diferente, mas tudo esta indo bem. Espero que com essa visibilidade que a acondroplasia está tendo na mídia, as pessoas tenham mais consciência e educação de que quando eles fazem piada, apontam, tiram foto ou dão risadas eles acabam com o dia de alguém, e isso não é uma coisa boa para o mundo - relata.
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A enfermeira Martha Souza, mãe da Marília comenta que o diagnóstico da filha foi bem traumático e desumano por parte do médico, isso fez com que a família ficasse ainda mais unida na criação da filha.
- Minhas filhas nasceram no interior do Paraná, depois do nascimento da Marília pensei em voltar para Santa Maria porque estando perto da minha família eu ficaria mais forte, eu sabia que o caminho seria esse, a questão do empoderamento, auto estima, liberdade, sempre estimulei muito as duas, para estudar e trabalhar. O problema é que é difícil as pessoas entenderem, se colocar no lugar do outro, na verdade o que eles tem é dificuldade para alcançar algum objeto e seria tão comum ajudar já que eles não alcançam. A novela tem ajudado, por ter uma abrangência muito grande e a gente vê que a as pessoas já mudaram um pouco de comportamento - comenta.